Um tema que foi polêmica nacional veiculado nos últimos anos foi o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal das ADC’s n. 44 e 45, que julgou a constitucionalidade do art. 383 do CPP, o qual dispõe sobre as possibilidades de prisões, no caso particular das ADC’s, a prisão após julgamento em segunda instância.
Thank you for reading this post, don't forget to subscribe!Thank you for reading this post, don't forget to subscribe!E no seio da discussão sobre a possibilidade de início do cumprimento da pena após julgamento em segunda instância estava outro instituto não menos importante e também gerador de polêmica, que é da prescrição, o qual regula o direito do estado de punir o acusado ou o condenado, em caso de pena, prevista tanto no art. 5º,incisos XLII e XLIV, da CRFB/1988, quanto no art. 109 e seguintes do Código Penal.
Segundo Juarez Cirino dos Santos, a prescrição determina a perda do direito de exercer a ação penal por fatos puníveis, ou de executar a pena criminal aplicada contra autores de fatos puníveis, pelo decurso do tempo: a) a perda do direito de exercer a ação penal significa a prescrição da pretensão punitiva do Estado; b) a perda do direito de executar a pena criminal concretamente aplicada significa a prescrição da pretensão executória do Estado.
Diante disso, conforme se sabe, a jurisdição brasileira não dispõe de estrutura que comporte toda a demanda criminal e efetiva prestação jurisdicional em um prazo razoável aos envolvidos, sendo certo que com a maciça interposição de ações penais por parte do Ministério Público, incluindo-se aí muitas condutas insignificantes, que sequer mereciam o custo da tutela estatal, assim como abuso do direito de recorrer por partes de advogados, o fatal caminho de muitas ações penais acaba por ser o da prescrição, motivadora de muitos discursos populistas e oportunistas penais de que se trata de um forte fator de impunidade.
Por evidente, tal discurso, como são a maioria dos discursos populistas penais, trazem em sua essência uma crítica intrinsecamente rasa e vulgar, pois não aprofunda aspectos tangencias que não podem ser ignorados.
Com o prolongamento do processo para além do tempo razoável, em razão da falta de estrutura para uma resposta célere e eficiente, processos cujos recursos ficavam anos nos tribunais sucumbiam à prescrição em razão do decurso do tempo.
Em relação às adc’s n.44, 45 e 54, que julgaram a possibilidade de prisão após julgamento em segunda instância, a prescrição também era fator considerado em razão de que uma das causas de interrupção da prescrição é justamente o início do cumprimento da pena, tal como dispõe o art. 117, inciso V do Código Penal.
Uma vez resolvida aparentemente a polêmica relativa à possiblidade de prisão após julgamento em segunda instancia, visto já se encontrar no Congresso a PEC n. 199/2019, o foco do punitivismo agora se volta para a prescrição da pretensão punitiva, eis que mesmo após a reforma de do Código Penal de 2010, a prescrição sempre foi motivo de ataque por parte de punitivistas que deliram com a ideia de impunidade, mesmo tendo o Brasil a terceira maior população carcerária do planeta.
De qualquer forma, a prescrição passou a ser o alvo de ataque do movimento da sabotagem inquisitória MSI, na medida em que novas interpretações a respeito das hipóteses de interrupção da prescrição para além dos limites legal e constitucional, em ofensa aberta ao princípio da legalidade, passaram a ganhar destaque e relevância, mesmo ao arrepio da reserva legal e para além de limites claramente semânticos vêm sido proferidas e aceitas pela comunidade jurídica, a exemplo dos RE n. 696.533/SC, de relatoria do Ministro Luiz Fux e do HC n. 176.473/SC, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes.
Com o volume oceânico de processos, some-se a isso os ventos punitivistas que de uns anos para cá causaram uma verdadeira inflamação da justiça criminal, por certo que muitos processos, por não cominarem penas altas, acabam por ser encerrados com a sobrevinda da extinção da punibilidade pela prescrição, gerando revolta e fomentando a falsa ideia de impunidade.
Admitir a interrupção da prescrição penal para além das hipóteses estritamente legais é sabotar a um só tempo a razoável duração do processo, a vedação constitucional à pena de caráter perpétuo e o princípio da legalidade, um dos mais caros ao Direito Penal e ao processo civilizatório. Se o estado não consegue punir em um tempo razoavelmente legal não é o réu que é o devedor desta conta.
Em seu 5º, incisos XLII e XLIV, a Constituição dispõe, respectivamente que a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; e que constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
Já o Código Penal, ao regular em seu art. 117 as causas de interrupção da prescrição, regula taxativamente como sendo: I – pelo recebimento da denúncia ou da queixa; II – pela pronúncia; III – pela decisão confirmatória da pronúncia; IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis; V – pelo início ou continuação do cumprimento da pena; VI – pela reincidência (este declarado inconstitucional).
Deste modo, a partir de um critério de taxatividade normativa e do princípio rígido da legalidade estrita, ainda mais se tratando de norma de caráter material, à míngua de qualquer previsão legal que imponha o trânsito em julgado também para a defesa como marco interruptivo da prescrição, já que o Judiciário não pode agir como legislador positivo, não subsiste razão para se extrapolar os limites objetivamente previstos na Constituição e na Lei.
Somente a Constituição Federal é quem define, de forma taxativa, os crimes imprescritíveis e o Código Penal que regula as causas de interrupção da prescrição, sendo certo que afora aquele rol previsto no art. 117 nem mesmo o legislador pode ampliar as hipóteses de imprescritibilidade, mormente a partir de interpretação que extrapola, de forma absurda, os limites semânticos do texto legal, daí porque qualquer interpretação para além dos limites legais deve ser repudiada em razão do seu mais completo caráter antidemocrático e autoritário.